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Como reduzir o desmatamento da Amazônia

Existe um certo consenso de que o desmatamento predatório da Amazônia deve cessar, mas não existe consenso algum em como fazê-lo. A presença real do Estado na região amazônica, isto é, legalização das propriedades, monitoramento e fiscalização podem reduzir e até eliminar o desmatamento ilegal e ação de grileiros, mas garantir um desenvolvimento sustentável para os quase 30 milhões de brasileiros que lá vivem é objeto de grandes divergências. É ainda necessário desmatar mais para garantir atividades realmente produtivas?

Extrativismo tradicional e um novo extrativismo usando tecnologias modernas de biotecnologia tem sido propostos, mas são todos projetos a longo prazo. Em contraste, os processos tradicionais em uso na floresta são muito arraigados e dão resultados econômicos imediatos: desmatar, soltar bois no pasto e depois plantar soja. Cerca de 30 milhões de hectares de área no Centro-Oeste do país, principalmente nos Estados de Mato Grosso, Goiás e Tocantins, são usados dessa forma e a área está expandindo como mostram os resultados do INPE para 2019.

Já existem mais de 200 milhões cabeças de gado no país que ocupam cerca de 200 milhões de hectares de áreas desmatadas ou do cerrado da floresta amazônica: uma cabeça de gado por hectare. Como grande exportador de carne estes números tendem a aumentar bem como a plantação de soja, item importantíssimo das exportações brasileiras.

Como reduzir o desmatamento legal e ilegal sem prejudicar esta pujante atividade econômica é o grande problema e não podemos nos iludir em pensar que apenas preocupações ambientais conseguirão fazê-lo.

Há contudo um novo tipo de atividade agropecuária na região Centro-Oeste do país que está indicando um caminho possível a seguir: o adensamento da criação do gado na região amazônica.

Ela se baseia na ampliação da produção de milho na chamada “safrinha” em rotação com a cultura de soja já estabelecida. É o uso duplo da terra não demandando a expansão para novas áreas agrícolas e, portanto, desmatamento.

O uso do milho para a produção de etanol já foi amplamente testado nos Estados Unidos que produz cerca de 60 bilhões de litros de etanol por ano, o dobro da produção brasileira baseada na cana de açúcar. Nos últimos 20 anos aquele país se tornou o principal produtor mundial de etanol criando um modelo integrado de produção de etanol de milho com o uso dos resíduos (dried distillers grain-DDG) na alimentação de gado. Com isso o etanol de milho, que era muito criticado, inclusive no Brasil, passou a ser competitivo e mostrar vantagens reconhecidas.

A dificuldade logística de transportar o milho para a exportação torna o etanol trazido do Sudeste ou importado dos EUA bastante caro nessas regiões, o que viabiliza a produção de etanol de milho no Centro-Oeste de baixo custo. O resíduo da produção do etanol de milho, o DDG, rico em proteína, é usado como alimento animal, sobretudo na época de seca quando falta alimento para o gado.

A consequência imediata do uso desta proteína é permitir o adensamento do gado. Atualmente cada cabeça de gado ocupa cerca de 1 hectare no Brasil. Bastaria aumentar este número de 10% para liberar 20 milhões de hectares de pastos no país, tornando desnecessária novas expansões para maior produção agrícola ou pecuária.

Já há alguns projetos implantados e a produção de etanol de milho já passou de 1 bilhão de litros em 2019.

A expansão da produção de etanol de milho integrada à pecuária de corte em partes das regiões Norte, Centro-Oeste e Nordeste poderia provocar importantes efeitos, tais como valorizar o milho produzido localmente ajudando o agricultor, aumentar a oferta local de etanol combustível com menores preços, permitir a intensificação da pecuária de corte tornando-a mais sustentável, liberar terras para a expansão de culturas alimentares e bioenergéticas, e ajudar a proteger a floresta remanescente.

A meta de dobrar a produção de etanol até 2030 que consta dos planos do Ministério de Energia poderá se basear na expansão das plantações da cana de açúcar e no uso do milho com as vantagens colaterais na redução do desmatamento como apontado acima.

Estas novas atividades econômicas com correspondente geração de novos empregos, diminuirão a pressão ambiental pela disponibilização de novas áreas para agricultura e criação de gado podendo se converter num importante mecanismo de redução de emissões de gases de efeito estufa, ajudando o país a pumprir os compromissos assumidos internacionalmente.

O que é necessário no momento é aprofundar os estudos para expandir o uso deste processo de produção de etanol integrado à intensificação da pecuária, identificar obstáculos à sua implantação e removê-los, dos quais os principais s são os seguintes:

  • Estudo de áreas para implantação de milho nos modelos safra e safrinha (dependente da soja) e culturas florestas energéticas (eucaliptos e outras).
  • Estudo técnico, econômico e ambiental da integração da produção de milho e etanol com a pecuária de corte e as culturas florestas/energéticas nas regiões centro-oeste e norte do país.
  • Impacto do uso do complemento proteico para gado de corte, raças utilizadas, densidade da ocupação do solo e produtividade.
  • Interação com outros programas nacionais existentes como o Renovabio e formulação de políticas e programas que favoreçam projetos de mudança do uso da terra.

Estas ideias têm sido propostas por especialistas de grande experiência no setor e mereceriam uma análise em profundidade pelo governo envolvendo a Embrapa e outros técnicos e cientistas das universidades brasileiras.

Luiz A. Barbosa Cortez foi ministro de Ciência e Tecnologia.

José Luiz Olivério é professor da Unicamp.

José Goldemberg, consultor